A prática ilegal da venda de um mesmo imóvel a duas pessoas é antiga, porém ainda ocorre e faz de clientes incautos potenciais vítimas, mas também gera condenações, inclusive de cunho exemplar. Uma recente coube à Sylar Construções e Empreendimentos Imobiliários Ltda. em ação cível ajuizada na Vara Única de Conde, cuja sentença foi mantida à unanimidade pela 2ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça da Paraíba e transitou em julgado (não cabe mais recurso).
O caso remonta há 2016, quando o técnico de informática Demétrius Douglas adquiriu um lote de terreno medindo 248,60 m2 no Loteamento Boa Vista II, Carapibus (Litoral Sul), no valor total de R$ 32.935,80 a ser pago em 96 parcelas de RS 291,05. Dois anos depois, ao visitar o lote, foi surpreendido com uma obra iniciada nele e após buscar informações, soube que a referida empresa havia vendido o bem para outra pessoa.
Ato contínuo, de forma exaustiva e amigável, resolver o problema junto à construtora, que alegou reconhecimento do erro e ofereceu a troca do imóvel por um novo lote, porém totalmente distintos e inferiores, o que inviabilizou o acordo extrajudicial, não tendo lhe restado outra alternativa, senão procurar a justiça, no sentido de rescindir o contrato por culpa exclusiva da empresa contratada, com restituição das verbas pagas, devidamente corrigidas, e indenização pelos danos de ordem moral.
Retenção de até 50% de valor pago
Nesse período, Demétrius teve ainda retidos valores de 10% relativos ao sinal do valor pago e de 50% sobre outro, o que agravou também as dificuldades para pagar os honorários advocatícios que asseguraram a reparação da injustiça sofrida.
No 1º grau, na Comarca de Conde, a juíza Lessandra Nara Torres Silva lembrou que a venda firmada entre Demetrio e a construtora e por esta a Natanael Tavares de Sousa se deu “ADCORPUS”, ou seja, os contratantes levaram em consideração o corpo, o objeto e as características de localização, suas comodidades e outras características que são levadas em conta, sendo a área do imóvel e descrição no contrato de importância secundária.
“Assim, cabível a imputação à promovida da responsabilidade quanto a construção irregular no local, pois apresentou irregularmente o mesmo lote a dois adquirentes, procedendo assim com a venda física em duplicidade, ou seja, apesar da descrição de dois lotes distintos no contrato, as partes procederam com a aquisição do mesmo lote”, acrescentou.
Causa dada por construto/vendedor
A magistrada citou também na súmula 543 do STJ, verbis: construtor/vendedor foi quem deu causa à resolução do contrato, a restituição das parcelas pagas deve ocorrer em sua integralidade, ou seja, o promitente vendedor não poderá reter nenhuma parte
E destacou que apesar da existência de individualização dos lotes pelos piquetes fixados no local, tem que cabe à construtora o dever de indicar o lote que está sendo adquirido, como forma de avaliação da localização e demais características levadas em consideração pelo adquirente, havendo assim manifesta falha no dever de informação.
Devolução integral de valores e danos morais
Por fim, ressaltou configurados os danos imateriais decorrentes não do mero descumprimento do contrato, mas sim daquele que transborda os limites da razoabilidade, reconheceu a abusividade do ato praticado, considerando as condições econômicas do ofensor, a gravidade potencial da falta cometida, as circunstâncias do fato, haja vista a demora por mais de um ano e condenou Sylar Construções e Empreendimentos Imobiliários Ltda a efetuar a Demetrius a devolução integral de valores pagos a título de prestações do contrato, com valor a ser corrigido pelo INPC e juros de mora de 1% a.m, ambos incidentes desde a data de realização do contrato com o segundo adquirente (29/04/2014).
E mais: fixou o valor da indenização por danos morais em 5.000,00 (cinco mil reais), acrescidos de juros de 1% ao mês, desde a citação e correção monetária pelo INPC, a partir de 12/1/2023 (datada da publicação da sentença), quando arbitrados os danos, conforme compreensão da Súmula 362 STJ e ao recolhimento das custas e demais despesas processuais, além de honorários no importe de 15% (quinze por cento) do valor da condenação.
Procedimento Comum Cível N. (7) 0800798-42.2018.8.15.0441
Apelação Cível N. 0800798-42.2018.8.15.0441