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A escalada da Selic e a precisão de Maílson da Nóbrega

A escalada da Selic e a precisão de Maílson da Nóbrega

No dia 11 de abril deste ano, o ex-ministro da Fazenda Maílson da Nóbrega me antecipou, com a lucidez que o caracteriza, o que poucos no mercado financeiro ousavam projetar: a Taxa Selic subiria para 15% em junho. A previsão se concretizou ontem, e com ela veio a constatação de que vivemos o juro básico mais alto em quase duas décadas, patamar que não se via desde julho de 2006.

Seu acerto é menos uma aposta certeira e mais um retrato do seu olhar aguçado sobre a persistente deterioração do ambiente inflacionário e das escolhas, ou falta delas, do campo fiscal.

Mesmo com o IPCA de maio apresentando seu melhor desempenho em meses, o Comitê de Política Monetária (Copom) optou por ignorar os números mais animadores. A nota oficial sequer mencionou a leve trégua inflacionária, reiterando que a inflação permanece “acima da meta”. Em 12 meses até maio, o IPCA chegou a 5,32%, superando de forma desconfortável o teto da meta de 4,5%. O recado, ainda que não dito com todas as letras, foi compreendido: o Banco Central está mais “hawkish” do que nunca — termo usado para designar posturas agressivas contra a inflação, mesmo que ao custo de desacelerar a economia.

Mau presságio

O que mais chamou a atenção na comunicação do Banco Central, no entanto, foi a repetição proposital da expressão “bastante prolongado”. Três vezes, em um curto comunicado, o Copom recorreu à mesma construção linguística para reforçar que a atual taxa deve se manter elevada por um período extenso. Analistas já tratam como consenso a previsão de que só em 2026 o ciclo de queda da Selic será retomado — o que significa quase dois anos de juros em níveis sufocantes para o crédito e o consumo.

Os reflexos são imediatos e concretos: o financiamento de imóveis e automóveis, principais instrumentos de mobilidade social da classe média brasileira, já encareceu de forma considerável. Famílias que sonhavam com a casa própria ou com o carro do primeiro emprego agora esbarram em prestações inviáveis, taxas de inadimplência crescentes e portas do crédito cada vez mais fechadas. Essa espiral afeta diretamente o crescimento, reduz a capacidade de investimento privado e posterga a retomada da confiança.

Necessidade de ajuste e a ausência de coragem política

A decisão do Banco Central pode até ser tecnicamente defensável diante da teimosia inflacionária, mas revela, também, o esgotamento de alternativas. Quando o fiscal falha, o juro sobe e quem paga essa conta não é o mercado, mas a população. Ao antecipar essa alta histórica, Maílson da Nóbrega não apenas demonstrou domínio técnico, mas expôs o pano de fundo de uma política econômica que segue tensionada entre a necessidade de ajuste e a ausência de coragem política para executá-lo. O Brasil caminha em terreno conhecido e perigoso.                                                                 

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