A transformação da matriz energética brasileira, com a ascensão das fontes renováveis, já é visível no cotidiano do país. A energia solar fotovoltaica, em particular, tem se destacado, com crescimento superior a 2.000% na última década, segundo a Empresa de Pesquisa Energética (EPE). Esse avanço, além de reduzir a dependência de fontes não renováveis, está redesenhando o papel do consumidor de energia, que passou a ser também produtor, o chamado prosumidor.
Essa nova figura tem cada vez mais importância no cenário energético, mas enfrenta desafios relevantes na relação com as distribuidoras de energia.
A geração distribuída, regulamentada pela Lei nº 14.300/2022 e pela Resolução Normativa nº 1.000/2021 da Aneel, garante ao cidadão o direito de produzir e consumir a própria energia elétrica. O modelo promove não apenas economia na conta de luz, mas também uma participação mais ativa na cadeia de energia. Com isso, os antigos consumidores ganham protagonismo e novos direitos. Ao mesmo tempo, precisam lidar com responsabilidades, regras e uma relação muitas vezes tensa com as distribuidoras de energia elétrica, que seguem sendo parte indispensável do processo.
Série de problemas
Embora essenciais para a rede — já que toda energia gerada precisa transitar pelas estruturas das distribuidoras — essas empresas vêm falhando em acompanhar o ritmo da geração distribuída. Entre as principais queixas dos prosumidores estão: atrasos excessivos na conexão dos sistemas, exigências técnicas pouco claras, falta de transparência nos processos e erros em faturas e compensação de créditos de energia. Essas falhas comprometem não só o retorno esperado pelos investidores, como também a confiança no modelo de geração distribuída.
A legislação impõe obrigações claras às distribuidoras, que devem garantir uma conexão segura, eficiente e dentro dos prazos legais. Porém, a incapacidade estrutural de algumas empresas de se adaptar a essa nova realidade tem resultado em descumprimentos graves. Isso impõe prejuízos diretos aos prosumidores, como cobranças indevidas, impossibilidade de economizar com a energia gerada e, muitas vezes, frustração diante de investimentos que não retornam no tempo esperado. A responsabilidade das distribuidoras, enquanto concessionárias de serviço público, é objetiva e está amparada por normas e decisões judiciais.
Indenização por danos
Os tribunais brasileiros têm reconhecido o direito dos prosumidores, aplicando a teoria do risco administrativo e o princípio da boa-fé. Quando as distribuidoras falham, os danos causados devem ser reparados. Já há jurisprudência consolidada que obriga essas empresas a cumprirem obrigações legais e a indenizarem prejuízos decorrentes de sua atuação. Embora o caminho judicial deva ser a última instância, órgãos como a Aneel, os Procons e entidades reguladoras estaduais também oferecem meios de defesa dos direitos dos prosumidores.
Garantir a efetividade da geração distribuída exige o equilíbrio entre o incentivo à produção própria de energia e o cumprimento rigoroso das obrigações por parte das distribuidoras. O respeito aos prazos e normas é fundamental para o funcionamento dessa engrenagem. O prosumidor não é mais um espectador passivo do setor elétrico: ele é parte central do novo modelo, com direitos que precisam ser respeitados e mecanismos legais para serem assegurados. Nesse cenário, buscar o Judiciário pode ser uma ferramenta decisiva para fazer valer esses direitos e consolidar uma matriz energética mais democrática, sustentável e justa.